quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Classe média

Eis que hoje eu pego um busão e (juro que foi sem querer) ouço uma conversa de duas provaveis new richs, tagarelando abertamente sobre como esse 'povinho sujo que vive nos ônibus' cheirava mal, quando uma senhora deveras delicada e pouco grande se irrita, levanta e aponta o dedo para as duas e questiona o por quê elas, que estavam tão incomodadas, não iam de táxi.

Óbivio que todos dentro do veículo tiveram a mesma vontade de mandá-las, de modo terno e suave, receber, logo abaixo de suas regiões lombares, um belo objeto magnânimo de cunho impróprio para menores.

é chato pensar em quanta gente não liga.
dói ver o descaso com que muita gente trata a camada inferior
ninguém se preocupa até que a água bata na própria bunda

é como se alguem peidasse na subida de uma escada sabendo que vem gente atrás, entende?
aí veio uma música na cabeça...
"Eu quero é que se foda a periferia toda...
Toda tragédia só me importa quando bate à minha porta"


E na deixa, me pego relembrando de velhas aulas de geografia, nas quais meu professor discorria sobre a má distribuição de renda no Brasil. Em função disso, pode-se dizer que o Brasil não é um país pobre, mas um país de muitos pobres (sem contar os pobres de espírito, é claro).
Digamos que no Brasil haja um montante X de dinheiro, e que esse montante circula pelo país.
Óbivio que esse montante não é distribuido igualmente para a população. Cada brasileiro deveria receber um salário de valor S. Tem gente que recebe S.5, tem gente que recebe S - S/5. Suponhamos que cada brasileiro tivesse que receber mensalmente 2 mil reais. Para que um infeliz receba 5 mil reais, outros tantos infelizes recebem menos de um salário mínimo.
É absurdo pensar nisso tudo. É impossível pensar nisso tudo sem sentir uma pontadinha de raiva e uma vontade de brincar de Hobbin Hood.

Como de costume, outra teoria veio à tona.

É como se o universo tivesse que distribuir uma quantia fixa de estado de espírito.
X pessoas no mundo podem estar felizes e completas. Y pessoas tem de passar pela má fase.
Para que uma pessoa Y fique plenamente feliz e realizada, uma pessoa da fase X tem que enfrentar problemas e cair na má fase.

Faço minhas as palavras do grande Tim Maia:
"Ah, se o mundo inteiro me pudesse ouvir,
tenho tanto pra contar...
Dizer que aprendi
Que na vida a gente tem de entender
que um nasce pra sofrer enquanto o outro ri."


Não sei se isso tudo realmente faz sentido para vocês...

ou faz, e ninguém entende...

Vai saber (?)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Cative-me, cultive-me, surpreenda-me e há-de ser recíproco

E foi então que apareceu a raposa:
- Bom dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu polidamente o principezinho, que se voltou, mas não viu nada.
- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira...
- Quem és tu? Perguntou o principezinho. Tu és bem bonita...
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Vem brincar comigo, propôs o principezinho. Estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa. Não me cativaram ainda.
- Ah! Desculpa, disse o principezinho.
- Após uma reflexão, acrescentou:
- Que quer dizer “cativar”?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos d uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
...Mas a raposa voltou a sua idéia.
- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando tiveres me cativado. O trigo, que é dourado fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...
E a raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me! Disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? Perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mau-entendidos. Mas, a cada dia, te sentarás mais perto...
No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração...É preciso ritos...
... Assim o principezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! Disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada!
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.
Depois ela acrescentou:
- Vai rever as rosas. Tu compreenderás que a tua é única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te farei presente de um segredo.
Foi o principezinho rever as rosas:
- Vós não sois absolutamente iguais a minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativaste a ninguém. Sois como era minha raposa. Era uma igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Agora ela é única no mundo.
E as rosas estavam desapontadas.
- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é porém mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob uma redoma. Foi a ela que eu abriguei com o paravento. Foi dela que eu matei as larvas ( exceto duas ou três borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.
E voltou, então, à raposa:
- Adeus, disse ele...
- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
-Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que fez tua rosa tão importante.
-Foi o tempo que perdi com a minha rosa... repetiu o principezinho a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não deve esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...
- eu sou responsável pela minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.

Sinto-me responsável por todos aqueles que eu cativei, ou que me cativaram. Isso é fácil? Não. Por vezes deixo de cuidar bem de cada um, com carinho e atenção que merecem. Mas cada amigo é para mim algo inestimável. É a grande oportunidade de aprender e de crescer como pessoa.
Há pessoas que são um equívoco, que talvez eu não soubesse cativar, ou que talvez eu reconhecesse nelas as minhas fraquezas e defeitos, e sendo assim eu descartei, deixei de lado de uma vez. Outras o tempo e espaço separaram, mas são como o trigo para mim, uma simples recordação me remete aos bons momentos juntos.
Eu amo todos que me cercam. Gostaria que todos soubessem, caso eu não tenha dito. As palavras, às vezes ficam travadas em nossa garganta, simplesmente não saem. Mas quando me encontrar, saiba que é com um grande abraço que retribuirei tua amizade.